Os Adultos Estão Obsoletos

A civilização em que você vive hoje está anos luz a frente daquela que Wolfgang Amadeus Mozart viveu entre os anos de 1756 e 1791 em Viena. Você não tinha ajuda da polícia a um clique do celular, as ruas não eram reguladas, passava na frente o cavalo que gritava mais alto, não existiam leis trabalhistas para proteger os menos favorecidos, o sistema de banco era um direito da elite da elite, comida e suprimentos eram escassos, sobrava lixo nas ruas das cidades, os líderes eram maníacos por sangue e sua burocracia era completamente desumana.

Nesse cenário surge Mozart e a sua música revolucionária. Basta escutar uma única vez os primeiros acordes da famosa Eine Kleine Nachtmusik para entender o que eu estou falando.

Mozart teve uma vida breve e intensa. Ele morreu com 35 anos, pobre e endividado, jogado em uma vala comum embrulhado em um saco de linho – até hoje não se sabe onde estão os seus ossos; apesar da sua fama ter percorrido toda a Europa, no seu enterro não havia uma só alma viva, ninguém acompanhou a carroça funerária, nem mesmo a esposa e filhos.

Durante sua curta estadia pela Terra, Mozart compôs mais de 600 obras de música clássica. Muitas delas desafiando os padrões de composição que existiam na época. Muitas delas complexas até para músicos experientes reproduzirem. A partir de um certo momento, suas músicas ficaram tão complexas que o público começou a fugir das suas apresentações. “Não vamos ao teatro para pensar, queremos nos divertir”, dizia o povo de Viena naquela época.

Além da música, Mozart ficou conhecido mundialmente como uma criança prodígio. Ele começou a tocar piano aos três anos de idade, compôs a sua primeira música aos cinco, escreveu a sua primeira sinfonia completa quando tinha nove anos. Ele tinha apenas doze anos quando completou a sua primeira ópera. Dos 5 aos 12 anos de idade Mozart compôs cerca de 12 sinfonias, 18 sonatas para piano e violino, 4 missas, 4 concertos para piano entre outras obras.

Ele era uma máquina de trabalhar e compor, estudar e se apresentar.

Sua prodigiosa performance é considerada única na história da humanidade. Tão única que muitos falam de intervenção divina ou coisa semelhante. Por conta disso, há uma impressão generalizada de que Mozart nunca teve que se esforçar para compor. Ele nasceu gênio, nasceu sabendo tudo que tinha que fazer.

Besteira!

Mozart era excelente. Tinha atitude, tinha coragem, tinha personalidade, tinha compaixão pelos outros, tinha humildade, tinha bom humor, tinha proatividade, tinha uma profunda vontade de aprender, mas, o que realmente empurrou Mozart para o sucesso foi a prática deliberada que o pai obcecado por sucesso o submetia; o ambiente em que viveu, as cidades, os amigos e admiradores que desenvolveu, a sua família, as diferentes fontes de inspiração que passaram pela sua vida, as viagens que fez, o eterno espírito de criança que possuía e não escondia dos outros. Mozart foi irreverente durante toda a sua vida.

O pai de Mozart já era um compositor conceituado e um exímio violinista quando ele nasceu. A sua irmã Nannerl com apenas quatro anos tocava cravo e piano melhor do que qualquer um com o triplo da idade. Mozart assistia a irmã tocar e aprendia tudo de ouvido. Leopold Mozart, seu pai, marketeiro e empreendedor, levou os filhos para diferentes turnês de apresentação pela Europa que somadas duraram sete anos. Durante todo esse tempo, pulando de cidade para cidade, a única diversão do menino Mozart era praticar praticar praticar conforme o seu pai dizia que devia fazer. Mozart teve o pai e a irmã, em diferentes momentos, como mentores do seu trabalho. Além disso, Mozart tinha facilidade em fazer amigos. Tornou-se amigo do filho de Bach, criou laços de grande amizade com o grande Haydn – vinte e quatro anos mais velho do que ele – com quem trocava idéias sobre como compor músicas revolucionárias.

A vida nas cidades da Europa também ajudou Mozart a criar. “Em cima de nós tem um violinista, abaixo tem outro, o vizinho da porta ao lado é um professor de canto que dá aulas todos os dias, e na porta à frente tem um escritor. Que felizes condições para compor! As boas idéias fluem a todo o momento!” Mozart, em carta escrita em Milão no dia 23 de Agosto de 1771 para sua querida irmã.

Até o stress o ajudou a criar as suas grandes obras. Mozart viveu uma vida muito parecida com a vida de qualquer pessoa batalhadora. Ele tinha várias contas para pagar, teve sérios problemas com dinheiro e cobradores, era casado, teve seis filhos, o seu pai, enquanto ainda era vivo, fazia pressão psicológica sobre Mozart, acusando de complacência na morte da mãe. A sua vida social era intensa, festas, aulas, recepções, reuniões, happy hours etc. O apartamento onde morava era pequeno, tinha que dividí-lo com os filhos, empregada, esposa, eventuais estadias do pai etc.

Ainda assim o número de grandes obras que Mozart compôs nessa época é impressionante. Nas muitas cartas que Mozart trocou com os familiares, ele relata o seu impulso irreverente de explorar novos caminhos na música, o seu método de composição, as noites em claro que passava em busca da nota perfeita, o seu contínuo estudo sobre como compor mais rápido e melhor.

Mozart não foi um gênio, ele tinha apenas a atitude certa com relação à vida e com isso atraiu as condições ideais para o desabrochar do seu talento.

NÃO EXISTE TALENTO NATURAL. Ninguém nasce sabendo nada. Tudo é aprendido em vida nas inúmeras chances que temos em vida.

Você se lembra dos 300 de Esparta? Esparta se posicionou na antiguidade como uma cidade produtora de guerreiros. Os moleques espartanos não nasciam com gominhos no abdominal, mas ao longo de muito treinamento, provas de dificuldade cada vez mais difíceis, se transformavam depois de décadas de trabalho no padrão de guerreiros que a cidade precisava.

Se Mozart não foi um gênio, ninguém é um gênio. Não existe genialidade, cientificamente ainda não foi encontrado o gene da genialidade nos nossos corpos. Talvez, um dia, no futuro, algo assim seja encontrado, e daí, nós seres humanos poderemos comprar o gene da música clássica em alguma farmácia perto da nossa casa. Enquanto isso não acontece, o negócio é trabalhar, trabalhar duro.

A jornada para o talento e a alta performance não é uma jornada para preguiçosos de corpo e alma. O desenvolvimento do talento e alta performance requer lutas interiores, sacrifícios e honestidade, geralmente características duras para quem é mole. NÃO EXISTEM ATALHOS! A busca da alta performance pede pelo menos uma década de trabalho, e você precisa investir o seu tempo de maneira inteligente, ao se engajar deliberadamente em um método de prática que se concentra em tarefas que vão além da sua competência e conforto.

Susan Boyle, a britânica feia e desengonçada que emocionou o mundo inteiro no programa Britan Got Talent é um bom exemplo de talento produzido depois de décadas de preparo. Um vídeo amador publicado no YouTube mostra Susan Boyle com vinte e poucos anos se expondo em um karaokê londrino duas décadas atrás. Ela era boa, mas a música que escolheu para cantar naquele karaokê não era a melhor de todas, o ambiente não era o mais adequado, os colegas estavam mais preocupados com a cerveja e com a farra do que a sua performance. Passou desapercebida. Porém, quem realmente quer chegar a algum lugar, e trazer resultados de alta performance para si e para os outros, JAMAIS deixa passar uma chance de provar o seu talento, e aprender alguma coisa.

Entretanto, alta performance não é apenas resultado da simples prática diárias de anos ou décadas de trabalho. Você precisa de um tipo de prática específica para desenvolver talento.

Quando a maioria das pessoas pratica, elas praticam coisas que já sabem como fazer. Eu estou falando aqui de outra coisa. Eu estou falando de um esforço específico e considerável em fazer uma coisa que você não sabe fazer direito, ou simplesmente não sabe fazer.

“Pratique o máximo que a sua concentração te permitir praticar. Quando eu comecei a me preocupar sobre o que as pessoas podiam dizer sobre eu praticar o dia inteiro, eu perguntei (ao meu mentor) Professor Auer quantas horas por dias eu deveria praticar, e ele disse, “Não importa quanto tempo. Se você praticar com os seus dedos, nenhuma quantidade de tempo é o suficiente. Se você praticar com sua cabeça, duas horas são o suficiente”.

Nathan Milstein, mega blaster violinista, procure no Google…

“Enquanto pratico eu também procuro desenvolver o meu poder de concentração. Eu nunca apenas entro em campo e apenas bato na bola”.

Bob Hogan, ultra campeão de golf.

Vamos imaginar que você esteja querendo aprender a jogar golf. Nos primeiros meses, você vai aprender o básico sobre como pegar no taco, bater na bolinha, fazer o swing etc, coisas que vão evitar que você cometa erros feios (como acertar a bolinha em outro jogador). O instrutor vai te dar permissão para praticar o golf no campo, batendo na bolinha para bem longe, e jogando com outros novatos como você. Em um curto período de tempo (talvez 50 horas, isso mesmo, apenas 50 horas), você irá desenvolver um controle de jogo bacana, e o seu jogo irá melhorar. A partir daí, você irá trabalhar as suas habilidades ao participar de um X número jogos etc; até que a sua maneira de bater na bolinha se torne automática. A partir daí, você passará a pensar menos sobre cada vez que bate na bolinha e passará a jogar mais pela intuição. O seu jogo de golf se tornará então uma atividade social, na qual você ocasionalmente se concentra em uma tacada. Desse momento em diante, o tempo adicional no campo não irá melhorar a sua performance, a qual permanecerá estável no mesmo nível por décadas.

Por que isso acontece? Você não melhora porque quando está jogando o jogo, você tem apenas uma chance de bater na bolinha a partir de um determinado local. Você não consegue imaginar como corrigir os seus erros. Se você tivesse a chance de bater na bolinha por cinco ou dez vezes a partir de um determinado local, você teria mais feedback sobre a sua técnica e começaria a ajustar o seu estilo de jogo para melhorar o seu controle. Os profissionais geralmente batem inúmeras vezes dos mesmos locais quando estão treinando e checam o campo antes do jogo.

Somente trabalhando o que você não sabe fazer direito, você pode se tornar o talento que você quer ser.

É um grande desafio para todos nós. Mas é um desafio que ninguém pode se dar ao luxo de não enfrentar. Nós vivemos em um mundo em que é preciso fazer mais com menos, um mundo onde o ser humano é um recurso cada vez mais caro.

Não é só uma questão de ter sucesso e se transformar no Mozart da sua indústria, mas de simples e pura sobrevivência. A economia global é mais competitiva do que nunca. A concorrência pode vir de qualquer parte e a qualquer hora. A empresa em que você trabalha precisa alcançar um desempenho brilhante para ser percebida pelos clientes que quer conquistar.

É um desafio para todos. Se reinventar em tempo real, observar os nossos atos, colher feedback, produzir um novo eu hoje melhor do que fomos ontem.

“Não é porque você sabe andar desde que nasceu que agora você é melhor em andar. É difícil para engenheiros experientes, por exemplo, permanecerem competitivos com jovens engenheiros treinados em novos e melhores métodos. Aqueles que são bem sucedidos têm que dedicar muito tempo extra para aprender sobre esses novos métodos. Para tanto, você precisa se colocar em situações em que recebe opinião dos outros. É um mito dizer que você melhora apenas fazendo as coisas que você gosta de fazer.”

K. Anders Ericsson, Professor de Psicologia, Florida State University, co-editor do livro Cambridge Handbook of Expertise and Expert Performance (Cambridge University Press, 2006).

Talento e alta performance se desenvolve. É preciso acreditar nisso para não cometer o erro de desperdiçar o talento de pessoas de atitude porque aparentemente não possuem o perfil para trabalhar em uma determinada área. É possível transformar uma pessoa que aparentemente “não nasceu para vendas” na melhor vendedora da empresa; é possível transformar pessoas humildes em grandes negociadores, pessoas envergonhadas em grandes oradores, pessoas simples em grandes empresários, e bons gerentes em líderes carismáticos e assertivos.

Em 1970, dois educadores húngaros, Lázló e Klara Polgár, decidiram desafiar o conhecimento popular que dizia que as mulheres não poderiam ser bem sucedidas no xadrez. Eles colocaram em prática um experimento que provou a todos o poder que a educação tem em transformar as pessoas. Além da educação que recebiam fora de casa, as três filhas do casal foram levadas muito cedo a jogar xadrez com seus pais em casa. O treinamento sistemático e a prática diária deram resultado. Por volta do ano 2000, todas as três filhas estavam ranqueadas entre as dez melhores jogadoras de xadrez do mundo. A mais nova, Judit, se tornou uma grande mestra do xadrez aos 15 anos de idade, quebrando o recorde da pessoa mais nova a ganhar esse título, conquistado antes por Bobby Fischer.

Além de tudo, Mozart era profético, “Mantenha os olhos nele; um dia ele fará o mundo falar sobre ele!”. Observação de Mozart sobre Beethoven na primavera de 1787. Essa foi a única vez que os dois compositores se encontraram.

O talento e a alta performance estão disponíveis para todos. Porém, por alguma razão ainda desconhecida, algumas pessoas são mais motivadas do que outras, poucos realmente querem se destacar da multidão, se sujeitar ao trabalho e pressão que existe pelo caminho, e deixar uma grande marca no universo.

“Eu rezo para Deus todos os dias para me dar a graça de me manter forte, para que eu posso honrar a mim mesmo e toda a nação alemã, para sua honra e glória; que ele me permita ser bem sucedido para que eu possa ajudar você a sair da condição terrível que se encontra, e possa trazê-lo para uma condição em que possamos viver juntos e felizes. Eu acredito que atingiremos esse objetivo seja na Terra ou no Céu.” Mozart, Paris, 1° de Maio de 1778 em carta para o seu pai que estava mergulhado em dívidas, e dava aulas particulares para ganhar algum dinheiro para promover a carreira do filho.

QUEBRA TUDO! Foi para isso que eu vim! E Você?